segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Seminário de Metodologia do Ensino de Língua Portuguesa na FEUSP, em outubro

VIII Seminário de Metodologia do Ensino de Língua Portuguesa: Formação Inicial do Professor e Repercussão na Sala de Aula
http://www2.fe.usp.br/~lalec/smelp2009/index.html

É com satisfação que comunicamos a realização do VIII Seminário de Metodologia do Ensino de Língua Portuguesa, cujo tema será Formação inicial do professor e repercussão na sala de aula. O evento ocorrerá em 07 e 08 de outubro de 2009 e terá os seguintes objetivos:

• Apresentar e discutir resultados de pesquisas e de novas experiências no campo da Metodologia de Ensino de Língua Portuguesa;

• Promover a socialização dos trabalhos dos alunos resultantes de seus estágios;

• Promover o intercâmbio entre professores do ensino fundamental, médio e superior e de estudantes;

• Propor novas reflexões sobre formação inicial e contínua de professores de Língua Portuguesa;

• Discutir novas demandas e novas perspectivas de abordagens para o ensino de Língua Portuguesa, Literatura e Lingüística.

A exemplo do que temos feito desde 2003, quando propusemos a realização do I Colóquio de Professores de Metodologia de Ensino de Língua Portuguesa e de Literatura , que neste ano será realizado na UFMA, de 03 a 06/11/09, bem como do que vimos investigando desde 2005, nesta edição do Seminário enfatizaremos as seguintes questões norteadoras das nossas preocupações em torno da especificidade das disciplinas encarregadas de fazer o elo entre linguagem e educação:

• A especificidade da disciplina Metodologia, ou Prática, ou Didática, de Ensino de Língua Portuguesa: Quais práticas dão contorno ao que é central na disciplina? Seleção de conteúdos? Formulação de atividades? Indicação de linhas teóricas mais eficazes para o trabalho na docência?

• A pluralidade de nomes e de endereços: Quais as razões e as conseqüências das variações como Didática da Língua e da Literatura, Prática de Ensino de...; Metodologia de... e outros? E da lotação do professor da disciplina, ora no Departamento de Letras, ora no Departamento de Educação, etc.?

• A natureza do relatório de estágio: como vem sendo conduzida a sua confecção? Com um caráter de reconhecimento da situação ou mais investigativo? Ele tem se tornado uma instância a mais de crítica à escola e às suas práticas cotidianas ou um estudo sobre a cultura escolar? Ele se constitui em um trabalho em que o licenciando pode exercitar a autoria?

• O papel, a importância e abrangência das práticas de estágio para a disciplina e para a formação do professor de Língua Materna e de Literatura: Como são avaliadas e valorizadas as experiências do estagiário? A realização do estágio, a presença do estagiário no cotidiano escolar, é também vista como um momento importante da pesquisa universitária? Como as universidades e as redes escolares se organizam para cumprir a LDB em relação às suas exigências legais em relação à formação do professor?

• A cultura institucional frente ao estágio: como lidar com uma cultura, infelizmente já instalada em muitas escolas, de fornecer a assinatura nas fichas de estágio sem que o estágio tenha sido realizado? Como instaurar projetos eficazes de trabalho em conjunto com a escola?

• A relação da disciplina com os documentos oficiais sobre o ensino de Língua Portuguesa, tais como PCNS, Propostas Estaduais, Municipais, etc: a disciplina deve estar a serviço da implantação destas propostas? É o lugar da crítica destas propostas? É um momento de teste? É um momento em que o aluno tem contato com as teorias que embasam as propostas?

• Os diálogos possíveis com as outras disciplinas: o que um aluno pode não saber ao chegar no estágio? Em que momento do curso a matrícula na disciplina é pertinente? Que tipo de leitura é pertinente fazer na disciplina? De reconhecimento de conteúdo? De busca de informação? De polemização?

• A atuação dos professores da disciplina enquanto área: Como tem sido nossa participação em eventos nacionais e internacionais? Há eventos regionais eventos específicos da área?

Essas questões têm motivado nossos esforços de pesquisa por meio de projetos que têm sido apoiados por diferentes órgãos:

• Representações concernentes à formação do professor de língua Materna: Estudos sobre a especificidade da disciplina “metodologia/didática/prática do ensino da Língua Materna” , apoiado pela Pró-reitoria de Pesquisa da USP, 2006 - 2008.

• Disciplinas da licenciatura voltadas para o ensino de Língua Portuguesa: saberes e práticas na formação docente , colaboração USP-UFMA, apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão- FAPEMA, 2008 - 2010.

• Projeto de Cooperação Acadêmica: Disciplinas da Licenciatura voltadas para o ensino de Língua Portuguesa , apoiado pelo Programa de Cooperação Acadêmica - PROCAD-CAPES (Processo No. 23038.0433099/2008-78), cooperação UFMA-USP-UERN, 2009-2013.

Temos a firme convicção de que a partir deste debate será possível reunir elementos para uma reorganização da área na busca de um perfil acadêmico e científico que faça jus à sua relevância na formação do professor de Língua Materna e de Literatura.

Contamos com a sua colaboração.

Comissão Organizadora

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Bilinguismo: ganho cultural ou mais um motivo para o fracasso escolar?

BILINGÜISMO: GANHO CULTURAL OU MAIS UM MOTIVO PARA O FRACASSO ESCOLAR

Heloísa Xavier da Silveira Calazan
Professora de Português e Inglês UFRJ, Pós-graduada em Literaturas de Língua Inglesa UERJ, Psicopedagoga – Instituto Isabel, Pós-graduada no curso de Formação de Professores de Português para Estrangeiros PUC - RJ
heloisacalazans@uol.com.br

“Conhecer verdadeiramente como um sujeito aprende é um conceito revolucionário, no sentido de aceitar este sujeito e fazer com que ele aprenda de verdade” (Jorge Visca)

Resumo
A proposta deste trabalho é primeiramente tecer certas considerações a respeito das colocações de Piaget e Emília Ferrero com relação ao processo de aprendizagem, focalizando não somente o papel do educador no contexto de aprendizagem bilingüe, como também a validade dos modelos de aprendizagem didáticos, para que haja sucesso nesta modalidade de apprendizagem. Apontará as vantagens de uma abordagem natural, sem deixar de aludir , é óbvio, à prevenção como uma ferramenta indispensável na educação cuja finalidade é minimizar toda e qualquer dificuldade que possa surgir na mesma.

Abstract
This paper aims to discuss some of Piaget’s and Emilia Ferrero’s thoughts about the learning process, focusing not only on the educator’s role but also on the validity of the didactic learning methods. It will also mention the advantages of the natural approach in education, without forgetting obviously, to allude to prevention as an indispensable tool for minimizing all and any difficulty that might occur in this learning modality.

Escolas Americanas são encontradas em vários países da Europa, da América do Sul e até mesmo no Japão. Só no Brasil existem mais que dez escolas americanas distribuídas por diferentes estados. Cursos livres de língua inglesa são também em grande número e até as pequenas cidades já oferecem a oportunidade de se aprender uma outra língua em cursos especiais para tal fim. Por que será que existe este grande desejo de dominarmos uma outra língua além da nossa língua materna? Os motivos são vários, mas o principal deles é podermos nos comunicar com indivíduos de culturas e países diferentes a fim de trocarmos experiências e conhecermos melhor o mundo onde vivemos.
Desta forma as escolas bilingües, como as americanas, inglesas, suíças, etc., passaram além de oferecer educação para os filhos daqueles que se deslocam constantemente de um país para o outro, também a oportunidade para os que querem proporcionar a seus filhos a chance de estudarem em uma escola de uma outra cultura e se tornarem adultos bilingües.
E como fica a educação neste momento? Quais serão as dificuldades que poderão ocorrer na aprendizagem em uma outra língua que não a materna? Será este mais um obstáculo e um outro motivo para o fracasso escolar?
Freqüentemente o bilingüismo é visto como a causa de confusão cognitiva, como coloca Collin Baker (1997). “Este processo é visto por muitos como um cérebro dividido em duas partes, cada uma com uma engrenagem trabalhando a meia força, enquanto o cérebro de uma pessoa monolíngüe teria apenas uma engrenagem trabalhando com força total”. Baker afirma que, na verdade, o bilingüismo deveria ser visto como um dos fatores que favorecem o desenvolvimento da área cognititva, uma vez que exige um maior exercício da mesma, provocando uma maior atividade neuronal, estabelecendo um aumento do número de ligações entre os neurônios do tônus cerebral. O problema não está no bilingüismo, mas sim em como as duas línguas são ou devem ser ensinadas e aprendidas de forma que ambas as línguas sejam totalmente dominadas pelo apren-dente. Para que aprendamos realmente a estrutura de uma língua é necessário estarmos expostos a ela de diferentes formas e muito freqüentemente. Se o aprendente for muito bem guiado dentro deste processo é muito pouco provável um fracasso por parte dele.
Para Piaget (1973), a adaptação intelectual do indivíduo é conseqüência de uma interação ou troca, que ocorre entre meio e indivíduo e envolve os mesmos processos que toda adaptação biológica envolve – assimilação e acomodação. Por um lado a pessoa incorpora ou assimila características da realidade externa às suas próprias características psicológicas, enquanto que também modifica ou acomoda suas próprias características psicológicas de forma a corresponder às exigências que o meio externo exerce sobre ela. Adaptação nada mais é que uma tendência do organismo humano a relizar este processo.
Estes dois processos ocorrem simultaneamente e a adaptação não ocorre sem organização. Organização é o processo pelo qual o indivíduo organiza suas atividades e a forma pela qual ele adiciona características novas à sua estrutura básica, para que possa atender às exigências de novas situações. O resultado da adaptação é que novas estruturas são continuadamente formadas, a partir das já existentes.
Piaget (1973) descreve inteligência como a capacidade do ser humano de se adaptar biologicamente ao mundo que o cerca, assim como o desenvolvimento de uma série de operações mentais que permitem um equilíbrio entre este indivíduo e o meio em que vive. Claro é que o indivíduo também traz uma bagagem hereditária em sua estrutura mental, que coloca limites no seu campo intelectual, limites estes que, salvo os casos de crianças com deficiências mentais, não constituem problemas de peso no aprendizado do indivíduo. Porém, esta bagagem é responsável pelos super dotados ou pelos dotados de dons artísticos especiais. Como ocorreria então este processo quando da aquisição de uma segunda língua, simultaneamente com a aquisição da língua materna?
Emília Ferreiro (1987) tece considerações sobre a idéia que alguns estudiosos tinham a respeito da forma pela qual o ser humano aprende a linguagem oral e escrita e a leitura. “Quando a criança produz um som que se assemelha à fala dos pais, estes manifestam alegria, fazem gestos de aprovação, demonstram carinho, etc. Desta forma o meio vai selecionando, do vasto repertório de sons iniciais saídos da boca da criança, somente aqueles que correspondem aos sons da fala adulta, do idioma em questão. Neste momento o problema resolve-se da seguinte forma: os adultos apresentam um objeto à criança e acompanham esta apresentação com uma emissão vocálica (isto é uma palavra que é o nome do objeto); por reiteradas associações entre a emissão sonora e a apresentação do objeto, aquele termina por transformar-se em signo e portanto se faz palavra.”
Porém, Ferreiro(1987) discorda desta teoria e afirma que “a criança não é passiva neste processo, esperando apenas pelo reforço externo, mas procura ativamente compreender a natureza da linguagem que se fala a sua volta e uma vez que consegue fazê-lo, formula hipóteses e busca regularidades, colocando a prova suas antecipações e criando sua própria gramática, a qual não é uma simples cópia deformada do modelo adulto, mas sim criação original. Podemos então compreender que a aprendizagem não ocorre a partir de elementos isolados que se unem posteriormente para construir um sistema, a linguagem; mas sim pela apreensão do todo, de cujas partes as funções vão aos poucos se definindo”.
Para Piaget (1973), a forma ideal de aprender é através do raciocínio lógico e não através da memorização, o que vem reforçar a colocação de Emília Ferreiro. Segundo estes parâmetros a pedagogia não deve temer o erro, nem o esquecimento, pois conforme afirma Piaget “através de erros e acertos o ser vai construindo seu conhecimento e o esquecimento não importa, desde que o indivíduo seja capaz de reconstruir o conteúdo esquecido”. Então, conclui-se que a melhor forma de adquirir uma segunda língua é como adquirimos nossa língua materna, o que implicará na compreensão da sintaxe, desta segunda língua, de forma que o indivíduo possa formular suas hipóteses em relação à gramática da mesma, buscando semelhanças, fazendo analogias e finalmente aprendendo sua estrutura através da compreensão das suas partes. A simples memorização de vocabulário deixa, então, de ser importante; o que realmente importa é todo o mecanismo em si. Para que o aprendente possa compreender a estrutura desta segunda língua deverá ficar bastante tempo exposto à ela, terá que se permitir o erro e não somente o acerto, pois através do processo ensaio e erro ele irá construindo aos poucos, com raciocínio lógico, as regras da “língua-alvo”, de forma a poder dominá-la um dia. Sabemos que o ser humano constrói sua linguagem da mesma forma que todo o resto do seu conhecimento. Assim é necessário uma análise cuidadosa de todo este processo de aprendizagem a fim de removermos obstáculos que possam surgir dificultando esta aprendizagem.
DELINEANDO AÇÕES PARA O SUCESSO NA APRENDIZAGEM BILINGÜE
Antes de tudo, é preciso compreender que bilingüismo não significa tão somente procurar semelhanças e diferenças entre sintaxes e semânticas das línguas em foco. Na verdade é um aprendizado bem mais complexo, que envolve também a aprendizagem de uma outra cultura (ideologia) bem diferente daquela da qual faz parte o indivíduo. É preciso que compreendamos a forma de viver e de ver o mundo dos integrantes da cultura da qual queremos aprender a língua para que possamos, então, estabele-cer paralelos, detectar semelhanças e diferenças entre as duas línguas. Linguagem é o “agir” do sujeito de forma consciente em relação ao mundo que o cerca. O uso da linguagem e o modo como o indivíduo a constrói determinará a forma como se processa o seu pensamento e a expressão de seus sentimentos. Sabido é que línguas diferentes, pertencentes a culturas diferentes, se expressam de formas diferentes. Portanto, muitas vezes existem palavras em uma língua que não podem ser traduzidas para outra, já que não possuem uma palavra eqüivalente nesta outra língua. A partir da compreensão de toda a complexidade que cerca a aprendizagem de uma outra língua. podemos entender, sem nos surpreendermos que haja casos de resistência, até mesmo inconsciente, por parte de alguns indivíduos,principalmente as crianças para aprenderem uma segunda língua.

O que é e como acontece o aprendizado da criança?
Para aprender é preciso que a criança tenha além da capacidade cognitiva nata uma afetividade posta sobre o objeto da aprendizagem, que no caso aqui enfocado é a segunda língua. Temos, portanto que levar em consideração o significado que esta segunda língua, bem como a cultura que ela representa, tem para a criança. Quando nem os familiares, nem a criança possuem nenhum elo com a cultura da segunda língua, os professores passam a ter a respon-sabilidade de estabelecer este elo, de forma que a criança possa ver algum significado na aquisição da nova língua. Neste momento todo cuidado se faz necessário de forma a evitar que a aprendizagem venha a assumir uma conotação negativa para a criança.
O conhecimento se constrói, como bem o coloca Maria Lúcia Weiss (1992), “através de uma articulação entre algo conhecido, algo por conhecer e o desejo de conhecer. Os questiona-mentos e a possibilidade de redescobrir o mundo são os propulsores do desejo de aprender do indivíduo. Assim, a aprendizagem deve ser proporcionadora de novas descobertas, através de experimentações, as quais, quando não resultam em resposta imediata para o problema, não devem ser vistas como “erros”, mas sim como um processo de constante mudança no “EU”- sujeito, sujeito este que deve ser visto sempre como um elemento ativo e não como receptor passivo do processo. A criança que se surpreende com o seu saber e com o seu potencial de fazer novas descobertas, estará sempre desejosa de adquirir novos conhecimentos”.

MODELOS DE APRENDIZAGEM
O ambiente tem o poder de estimular ou inibir a aprendizagem da linguagem. A aprendizagem é um processo basicamente social – processo de integração, troca social. Neste processo temos que levar em conta três aspectos importantes:
1- O conhecimento da criança e a relação que ela faz entre o que ela já sabe e o que lhe é ensinado. A forma como ela vai assimilar seu aprendizado novo é o que podemos determinar como sendo sua modalidade de aprender, a qual varia de ser para ser.
2- A bagagem biológica que a criança traz desde seu nascimento, a qual não pode ser modificada. Esta bagagem determina o potencial e as limitações do ser humano no que diz respeito a aprendizagem.
3- A intervenção psicopedagógica, que é uma ferramenta que pode e deve ser usada por profissionais competentes (psicopedagogo, psicólogo, fonoaudiólogo, etc.) sempre que se fizer necessário para que se possa ajudar a criança em seu processo de aprendizagem.
São muitas as escolas que ainda fazem uso do modelo didático, ou seja aquele no qual o professor fala e o aluno ouve, na maior parte do tempo.Este modelo apresenta os se-guintes aspectos negati-vos: é excessivamente estruturado; é totalmente controlado pelo adulto; faz usos de recursos pouco naturais para o aluno e torna a aprendizagem totalmente passiva.
Observamos que crianças muito novas, aprendendo uma segunda língua, têm dificuldade em relacionar e processar conteúdos que não tem significado imediato e real para elas. Além disso suas habilidades lingüísticas são ainda pouco desenvolvidas, até mesmo na língua materna. É necessário portanto que a aprendizagem se faça da forma mais concreta e natural possível, envolvendo o maior número de experiências possíveis. Para estas crianças, o processo de generalização ainda é reduzido, daí a necessidade de viven-ciarem bastante as experiências novas, de forma a assimilá-las ao seu conhecimento anterior.
O interesse do aprendente não é de imediato o uso de frases gramaticalmente corretas, mas sim poder se comunicar com o mundo que o cerca e interagir com os outros aprendentes neste novo código. Portanto o praticar excessivo e extremamente repetitivo de estruturas gramaticais corretas não deveria ser o enfoque primordial no ensino bilingüe. Uma vez que a criança comece a dominar este outro código e consiga compreendê-lo, automaticamente ela se tornará capaz de corrigir-se conforme os modelos a sua volta, da mesma forma que ela tem esse tipo de atitude em relação a sua língua materna. O modelo didático pode se tornar desinteressante para o aprendente que por conseguinte se aliena do processo de aprendizagem, levando muitas vezes o professor a interpretar tal atitude como um indício de que o aluno seja incapaz ou não tenha aptidão para a aprendizagem bilíngüe.

UMA ABORDAGEM NATURAL
É preciso ensinar a língua de modo integrado e não separar forma e funcionalidade. Isto não significa que não seja possível, em determinados momentos, uma abordagem mais acadêmica e portanto mais estruturada. Porém o aprendente deverá ter sempre a certeza de que está aprendendo uma outra língua porque esta lhe será útil e que portanto tal aprendizado possui um significado real. Se, por exemplo, a criança ao ser introduzida ao código escrito da língua não imaginar que esta é também uma outra forma de comunicação entre ela e seus “amiguinhos”, ela não verá objetivos imediatos em aprender a ler e escrever e não se interessará em fazê-lo.
Como exemplo da força do desejo de aprender relatarei a seguir um caso real: um aluno X, de nacionalidade argentina e portanto falante de espanhol, foi colocado aos 8 anos em um curso de inglês para crianças. Depois de repetir o curso básico duas vezes, foi sugerido a seu pai que o retirasse do mesmo, com a afirmação de que X “não tinha aptidão para línguas”. Seu pai, dois anos mais tarde, foi transferido para Londres e a família o acompanhou.
X foi então matriculado numa escola para nativos e não apresentou problemas para aprender uma outra língua. Houve aí a compreensão por parte da criança do quanto era necessário ela aprender este novo código, sem o qual não poderia se socializar nem sobreviver na nova sociedade.
Mais tarde novamente seu pai foi transferido para o Brasil e, uma vez mais X aprendeu rapidamente outro código: a língua portuguesa. Hoje X é fluente em três línguas, quando havia sido declarado a seu respeito que ele não tinha aptidão para línguas!
Pesquisas recentes têm provado que o processo de construção do conhecimento humano ocorre mais rápido se a abordagem for natural. A abordagem natural promove um aumento significativo na atenção do aprendente e um maior interesse pelos conteúdos propostos. A possibilidade de sucesso é portanto muito maior.
Para uma abordagem natural são necessárias estratégias específicas:
a) Adaptar os objetivos ao nível real de desempenho e interesse da criança.
b) Estruturar o ambiente de tal maneira que a criança deseje e possa realizar as tarefas propostas.
c) Responder à iniciativa da criança com solicitações que sejam semelhantes aos objetivos por ela propostos, ajudando-a para ser bem sucedida.
d) Estimular e reforçar suas tentativas de comunicação, dando-lhe sempre atenção.
e) Criar situações em que ela tenha o interesse e o desejo de aprender a falar usando este novo código.
f) Permitir a criança um maior tempo para elaborar suas respostas.
g) Criar situações de desafio para a criança, de forma que ela terá que reagir, fazendo assim uso
da linguagem, mesmo ainda que precariamente (por exemplo : jogos, competições, etc.)
h) Quebrar a rotina criando situações diferentes das do cotidiano, fazendo com que a criança tenha que se manifestar.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A criança bilingüe na verdade é aquela que pensa também na segunda língua, o que só acontece quando ela é criada num ambiente no qual ambas as línguas são faladas naturalmente.
Para que as crianças bilingües possam alcançar o êxito no processo de aprendizagem, devemos ter em mente que elas precisam ser capazes de resolver de 60% a 70% das atividades que lhes sejam propostas, o que significa ser necessário muito cuidado na escolha das mesmas por parte do professor.
Prevenção é a palavra chave e é tão importante que atualmente vem sendo constantemente enfocada em periódicos publicados nos Estados Unidos e na Europa sobre educação bilingüe – “The Bilingual Family Newsletter” – os quais são distribuídos para todas as escolas bilingües e enviados para as escolas americanas fora do país. Neles são enfatizados temas tais como o Aprendizado da Segunda Língua, Dicas para Educação de Crianças Bilingües, Bilingüismo não é Fácil e outros. Segundo este mesmo periódico,”língua, cultura e identidade estão relacionados de várias formas e é por isto mesmo que o poliglotismo pode causar um impacto no desenvolvimento da personalidade do indivíduo...” (vol.15 N.2), no que se poderia concluir dizendo que tal impacto, com certeza, se reflete na aprendizagem do mesmo, positiva ou negativamen-te, dependendo da forma como esta acontece.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
BAKER, Collin. Foundations of Bilingual Education and Bilinguism. Multilingual Matters. England. 1997.
CLAY, Mary M. The Early Detection of Reading Difficulties. Heineman Education Books, Inc. 3th ed. Hong Kong. 1989.
FERRERO, Emilia & Teberosky, Ana. Psicogênese da Língua Escrita. Artes Médicas. 1987
NESSEL, Denise D. & Jones, Margaret B. The Language Experience Approach – “A Handbook for Teachers”. Teachers College Press. New York. 1988.
OPPER, Sylvia & Ginsgurg, Herbert. Piaget´s Theory of Intelectual Development – An Introduction. Prentice Hall Inc. New Jersey. 1969.
PIAGET, Jean. A psicologia da Criança. Difusão Européia do Livro. 2a ed. São Paulo. 1973.
RHODES, Lyn K. & Curt, Dudley. Readers and Writers with a Difference – A Holist Approach to Learning Disable and Remedial Studies. Heineman Education Books Inc. Canadá. 1977.
THE BILINGUAL FAMILY NEWSLETTER [In: News and Views for Intercultural People]. 1998, Vol. 15 N.3 Seven Grafics. Inglaterra.
VISCA , Jorge. Psicopedagogia Novas Contribuições. Nova Fronteira. Rio de Janeiro. 1991.
WEISS, Maria Lucia L. Psicopedagogia Clínica – Uma Visão Terapêutica. Artes Médicas. Porto Alegre. 1992.