Elisete Oliveira Santos Baruel
Originalmente disponível em http://www.planetaeducacao.com.br/portal/artigo.asp?artigo=1029
Somos professoras da EMEE Anne Sullivan, uma escola especial da rede municipal de ensino de São Paulo, onde temos seis escolas para surdos e surdos com múltiplas deficiências. Ao lermos a versão preliminar do documento de política nacional de educação especial na perspectiva da educação inclusiva, passamos a refletir sobre alguns pontos.
A inclusão é necessária, mas exige esforço, tempo, ação, mudança, diálogo e reflexão.
Inclusão exige cautela, estudo, flexibilidade na postura do educador, possibilidade de inovar e reconhecer-se aprendiz.
Incluir exige uma postura social e política de comprometimento e cooperação entre as diferentes esferas sociais. Não aparece contemplada no documento a cooperação e a definição dos papéis das áreas da saúde, da cultura e da assistência social no importante processo da educação inclusiva.
Este documento é um avanço nas questões da inclusão frente às diversidades regionais tão grandes que enfrentamos no Brasil, mas ao reduzir o atendimento dos surdos somente a uma possibilidade (atendimento especializado no turno contrário ao da escolarização) minimizam-se as perspectivas de seu desenvolvimento e impede-se o exercício de seus direitos lingüísticos e de sua liberdade de escolha.
Esta restrição das possibilidades de escolha dos surdos também poderia se caracterizar como discriminação segundo a definição dada pela Convenção da Guatemala (1999) citada no item 22 deste documento, uma vez que tendo os mesmos direitos humanos e liberdades fundamentais que as demais pessoas o surdo tem o direito de optar por diferentes tipos de atendimento escolar, inclusive a escola bilíngüe - Decreto 5626/2005.
Existe uma necessidade real da manutenção das escolas bilíngües para os alunos surdos para que ocorra a verdadeira inclusão deles na sociedade, pois é na escola bilíngüe que se asseguram as condições necessárias a uma educação de qualidade: para que o surdo possa se constituir como sujeito há necessidade da presença de seus pares lingüísticos no seu processo de aquisição de língua e de conhecimento.
A língua de sinais implica na identidade e na cultura desses indivíduos, e não pode reduzir-se a uma experiência de linguagem “vocabular”, mas precisa ser de fato uma experiência comunicativa. Daí a importância das crianças surdas estarem inseridas nas escolas bilíngües para aquisição e desenvolvimento da Libras.
A língua é compartilhada e, para o surdo, é a língua que estabelece o quanto se consegue compartilhar e estar inserido na sociedade e na cultura. A experiência de vida modificada pela Língua de Sinais, torna-se uma experiência visual de mundo e produz manifestações culturais próprias que ocorrem no contato diário e constante com seus pares lingüísticos.
Por estas razões, na Educação Infantil e nas séries iniciais, só a presença do intérprete não garante a inclusão, pois o aluno ainda não tem suas bases lingüísticas construídas.
Acreditamos que as escolas bilíngües estão adequadas à política de inclusão na medida em que possibilitam o desenvolvimento lingüístico, cognitivo, crítico e criativo dos alunos surdos e que não são substitutivas da educação regular uma vez que a organização das EMEEs respeita as modalidades de educação infantil e ensino fundamental oferecendo a mesma escolarização da rede regular.
Participamos de todos os programas propostos para as escolas regulares como: TOF, PIC, Mão na Massa, Formação de Matemática, Orientação Sexual, entre outros.
Como resultado do trabalho desenvolvido nas EMEEs , apresentamos nossas produções no livro” Projeto Toda Força ao 1º Ano – Contemplando as especificidades dos alunos surdos” ( www.educacao.prefeitura.sp.gov.br ).
Considerando essas especificidades do aluno surdo ressaltamos a importância de que o processo de alfabetização e letramento e conseqüentemente o ensino da Língua Portuguesa na modalidade escrita difere em muitos aspectos do aluno ouvinte uma vez que para o surdo esse processo é metalingüístico por comparação e não auditivo/sonoro. Isso implica que há diferença na forma de ensinar a Língua Portuguesa para surdos e para ouvintes. A Língua Portuguesa e a Libras são línguas distintas com estruturas próprias e não podem ser usadas simultaneamente ou sobrepostas. Deve-se considerar que a presença do intérprete não garante o sucesso do surdo no processo de alfabetização e letramento, pois somente a tradução da explicação do professor não é suficiente para que o surdo elabore hipóteses sobre a construção da Língua Portuguesa.
Na bibliografia apresentada no documento não foram citadas referências aos trabalhos de pesquisa científica, inclusive os subsidiados pelo governo, realizados nos últimos 10 anos, na área da educação de surdos.
O decreto 5626/2005 prevê no artigo 22 a organização de escolas e classes de educação bilíngüe, o que não foi considerado na elaboração deste documento.
A educação especial teve uma trajetória semelhante à da educação em geral, considerando-se sempre o que é melhor para o educando conforme o momento social, pesquisas e as teorias que fundamentam nosso trabalho.
As escolas de surdos estão trabalhando pela educação inclusiva, mas uma inclusão responsável e criteriosa que traga de fato benefícios e APRENDIZAGEM para TODOS.
Ana Claudia Fossati Mota
Ana Cristina Camano Passos
Ana Luiza Pedroso de Lima
Ana Maria Reichert Zemann
Flavia Francisca Damascena
quarta-feira, 13 de janeiro de 2010
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2 comentários:
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